domingo, 2 de fevereiro de 2014

2- 02 -2014 “CINEMA TAMBÉM TEM DE DAR LUCRO”


CINEMA TAMBÉM TEM DE DAR LUCRO”

Este ano, o ator Wagner Moura pisou em dois novos territórios: Hollywood, com o filme Elysium, e o universo corporativo, do qual se aproximou em busca de investidores para a primeira direção de sua carreira – um filme sobre o guerrilheiro Carlos Marighella. Aqui, ele fala de carreira, da indústria do cinema e dos encontros com o mundo empresarial.

Como é o contato do artista com o mundo executivo? 
Como há um abismo social e econômico grande no Brasil, as visões são estigmatizadas, tanto por quem está embaixo, quanto o contrário. Eu venho de uma raiz pobre e já vi o mundo empresarial com um olhar de ‘esses caras não sabem nada’ – e muitos não sabem mesmo. A ignorância tem duas pontas sociais: a da pessoa que não teve acesso à educação porque nasceu pobre, e a da elite, que tem bilhões de dólares e nunca foi a um museu nem leu um livro. Mas esses encontros me mostram que nada é absoluto. Fico feliz porque tenho encontrado empresários que querem contribuir com o desenvolvimento do Brasil.

Quem são os empresários que admira? 
O Laércio Cosentino, [presidente] da Totvs, por exemplo. Eu andava afastado da publicidade, mas recentemente fiz propaganda para a Totvs. Cada vez que encontro uma empresa, empresário ou produto que eu acho que vale a pena associar a meu nome, não tenho pudor em fazê-lo. Para mim, um comercial é um comprometimento grande. Não que eu seja ingênuo. Sei que vivemos em um mundo capitalista e eu consumo coisas. Mas gosto de dizer que sou de esquerda – o que hoje nada tem a ver com o estereótipo do cara de esquerda dos anos 60. Pra mim, ser de esquerda é ter um olhar humano sobre a vida.

O que é ter um olhar humano sobre a vida? 
Ter uma consciência social, visão de futuro, pensar no Brasil politicamente. Quando faço propaganda para uma empresa, quero conhecer o que há por trás. Conversei com o Laércio em um âmbito mais pessoal e descobri que ele é um cara preocupado com essas questões.

O que você precisa para estar feliz, em paz? 
Estou em um momento de busca de equilíbrio, que tem a ver com o fato de eu ter uma família e ser artista. Minha mulher [a fotógrafa Sandra Delgado] e meus três filhos [Bem, 7, Salvador, 3, e José, 1] ocupam 100% da minha vida mental e emocional e mais ou menos 80% do meu tempo. Minha busca é me dedicar à minha família sem perder a loucura do artista, a intensidade que tenho no trabalho.

O que é o sucesso?
Convencionou-se chamar de sucesso o reconhecimento midiático. Mas não é esse que eu persigo. Claro que quero ser bem-sucedido e, pela natureza do meu trabalho, isso significa ser visto por muita gente. Mas sucesso, para mim, é ser feliz, estar satisfeito, aprender, fazer algo que faça sentido na minha vida, que me deixe em paz.

Como avalia o atual momento desse mercado? 
O que falta no Brasil é o compromisso de o filme dar retorno financeiro. Está na hora de rediscutir o modelo de financiamento das produções. Porque já é possível separar o filme que caminha com as próprias pernas, ou seja, com investimento direto de empresas, e o filme que precisa do dinheiro público, por meio das leis de incentivo fiscal. Hoje, há filmes que obedecem a uma fórmula preconcebida, especialmente comédias, e que performam bem, com 4 milhões de espectadores. Isso gera receita. E está na hora de prestar contas dela.

Você enxerga o cinema brasileiro como um negócio? 
Sim. Quero que as coisas que faço como artista sejam bem-sucedidas comercialmente. Tenho zero daquela vaidade de dizer que o que faço é para pouca gente.

Qual é o impacto em sua vida pessoal do trabalho de ator, de assumir a identidade de outras pessoas? 
O material de trabalho do ator é o corpo, e isso é forte. Você faz uma cena de emoção, acaba a cena, você pega uma xícara, e sua mão ainda está tremendo. É inegável que isso tem algum efeito. Mas não gosto de pensar o trabalho do artista como algo especial. Como em qualquer profissão, o que vale é o quanto você tem consciência do que está aprendendo com aquilo. Tem mais a ver com a forma como a pessoa se coloca na vida do que com a profissão.

Este ano, você estreou em Hollywood, no filme Elysium. Quais as diferenças de trabalhar lá e aqui? 
O que muda é o dinheiro. E lá tem muito. As equipes são muito grandes e, se passar do horário, ninguém liga. Porque eles sabem que vão ganhar hora extra. Aqui, o diretor fala: ‘Pelo amor de Deus, vamos filmar mais meia hora?’. A equipe pode dizer sim ou não. Para você ter uma ideia, Elysium custou US$ 115 milhões e Serra Pelada R$ 10 milhões. E nós reconstruímos um garimpo. Nos Estados Unidos, só o cachê de um ator coadjuvante deve ser esse valor. 

 

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